segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

O Poema Sanguíneo e Blues da Piedade

Como há a alta probabilidade de, caríssimos, não perceberem rigorosamente nada deste título, passo a explicar: "O Poema Sanguíneo" é um poema de minha autoria que resolvi expor aos vossos, tão rigorosos e altos, olhos e "Blues da Piedade" é um poema de um autor brasileiro, Agenor de Miranda Araújo Neto, mais conhecido, ou talvez, para alguns igualmente desconhecido, como Cazuza. Como primeiro se apresenta o que é decente e só depois o projecto de coisa nenhuma é justo apresentar o que é consagrado primeiro e, só depois, o que não tem mais comentário. Como é óbvio todos os direitos do projecto estão reservados a mim, sendo que na sua miserabilidade, nem dados alguém os quer.

Blues da Piedade:

Agora eu vou cantar pros miseráveis
Que vagam pelo mundo derrotados
Pra essas sementes mal plantadas
Que já nascem com cara de abortadas

Pras pessoas de alma bem pequena
Remoendo pequenos problemas
Querendo sempre aquilo que não têm

Pra quem vê a luz
Mas não ilumina suas minicertezas
Vive contando dinheiro
E não muda quando é lua cheia

Pra quem não sabe amar
Fica esperando alguém que caiba no seu sonho
Como varizes que vão aumentando
Como insectos em volta da lâmpada

Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem

Quero cantar só para as pessoas fracas
Que tão no mundo e perderam a viagem
Quero cantar o blues
Com o pastor e o bumbo na praça

Vamos pedir piedade
Pois há um incêndio sob a chuva rala
Somos iguais em desgraça
Vamos cantar o blues da piedade

Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem.
Cazuza

O Poema Sanguíneo
A tinta que me suja as mãos é sangue,
Sangue assassino dos meus actos pecadores,
Dos amores lânguidos e do mundo exangue
Como eu sou. E eles em mim são horrores,
São apocalípticos e mais que apoteóticos terrores
Como cabeças decepadas e roídas pelos ratos,
Imagens de vómito repugnante e torpor letárgico…
Só mesmo a cambaleante e morta ilusão torna mágico
Este mundo cheio de certezas, de arrogância dos factos.

Só mesmo o sonhar, que eu não tenho, torna suportável
O mundo morto de tanta coisa vulgar e normalizada,
Tanta regra, tanta imposição, tanto nojo razoável,
Por isso é que tenho escrito além da coisa suportada,
Tenho escrito para que ninguém aguente ler, nem diga
Nada do que o mundo não é, nem, enquanto nosso, poderá ser.
O mundo está sedento de um herói para ser crucificado
Para que todos se arrependam, como sempre, tardando.
Tudo se dá demasiado lentamente neste mundo conspurcado
E eu só sei num gesto traduzir tudo o que vejo: vomitando…

O mundo vive na esperança do auto-de-fé inquisitório,
Vive do cheiro da carne assada dos outros, da dor alheia,
A vida é poluída por fedor de perfume tão ou mais ilusório
Que ela, meretriz gordurenta, dada a cada homem que a anseia,
E quer sentir no seu corpo, na sua carne, a ilusão que (o) come.

O pão duro e amargurado que nos dias da morte, ele consome,
E o consome por dentro, queimando como azeite fervente,
Como veneno que contacta a pupila do óculo humano
E o faz rodar na órbita da dor tão forte e envolvente,
Como o abraço da vida luxuriante que todos sonham,
E que cada um, a seu modo, diz que tem…e mente.

Não há, nesta podridão, vidas de sangue, sanguinárias,
Vidas que ou se odeiam ou se amam além da bruma,
O Homem é dado a este meio-termo das coisas primárias,
Não se mata nem se morre por coisa nenhuma,
Não há um dia mais que não seja um dia perdido,
Numa vida dourada pelo estrume de quem mais defecou,
Consumido no desperdício medroso de não ter vivido,
Se entrega brando e sereno à morte que sempre sonhou.

A minha morte não será essa, senhores e espectadores,
Arderei num fogo infernal banhado em ácidos quentes!
Estraçalhado pelas correntes do Submundo, sentindo as dores
Dos mártires na pele, os olhos arrancados por vis dentes
Das bestas negras que domina e manda o deus profundo!
Ossos partidos por martelos com força tal, que o grito
De dor troará até que Deus vire, aflito, a divina feição!
As juntas dos ossos abertas como a pele enegrecida
Queimada e comida pelo cão negro, o negro cão
Que devorará o que restar da minha existência carcomida…
E todo ensanguentado por toda a sobeja vontade desmedida,
Pela maneira como quis decidir, e, mal ou bem, fui decidindo,
Não me dobrei perante o céu, cheirando o pó dos condenados,
Vós ireis todos imundos, enfileirados, meu cadáver vai só…e vai rindo!
Rafael Cardoso Oliveira


Quero mentes ousadas para comentar, dispensam-se gentilezas de qualquer tipo, digam o que quiserem.

Citação só p'ra dar trabalho:
"Confutatis maledictis,
Flammis acribus addictis"
Mozart, Requiem

Finalmente acabou, podem libertar-se...

1 comentário:

Anónimo disse...

pah "vais" morrer da maneira que diszes e ainda vais t a rir??xD
os teus poemas sao muito bons, nao digo isto só por ser tua irmã... Apesar de complicados são muito bons
beijo