sábado, 21 de novembro de 2009

Amor de Predefinição

Irmãos,

Naquele tempo da tecnologia inexistente, em que Jesus pregava em terras de Nazaré, não havia, como por certo sabem, telemóveis. Tem esta afirmação toda a preponderância; é toda ela uma máxima indissolúvel de razão e todo o mote deste post que se vai, pacientemente, estendendo. Jesus não possuía telemóvel. A todos quantos mui pacientemente vão seguindo esta pequena dissertação sobre a tecnologia nos tempos idos do filho do altíssimo, seja esse altíssimo quem for, rogo-vos um pouco mais de paciência ainda. O suspense é uma daquelas características essenciais num post da dimensão do que se avizinha, principalmente quando não há, quanto à temática, muito a dizer. Nesse supradito tempo ido, Jesus espalhava a palavra do senhor, o amor ao próximo e a paz e tem isto tudo a ver com o tema que me traz aqui, neste dia 22 de Novembro do ano da graça de 2009. Antes de mais, note-se a profunda referência encapuzada ao romance do senhor Camilo, o Castelo Branco, no título deste post, algo propositado mas inócuo em toda a sua extensão para o assunto sobre o qual venho discorrendo; há ressalvas que devem sempre fazer-se.

(Dar-se-á agora o que parece ser uma mudança de assunto completamente desconexa que apanhará o público desprevenido, ou melhor, e como popularmente se diz, com as calças na mão ou com a famosa boca na botija, expressões de uma beleza tal que não é possível deixá-las conscientemente de fora de uma didascália deste calibre. Luz forte sobre as primeiras linhas.)

Estava eu, na imensidão de tempo que tenho à minha disposição, sossegadamente a ler mensagens e a enviar umas quantas, passatempo pelo qual não nutro qualquer tipo de interesse particular, leia-se, interesse igual àquele que o comum dos mortais nutre, quando me deparo com uma secção do menu de Mensagens que me vem surpreender com o facto de eu ter Items Gravados, items esses que consistem de 11 modelos de mensagem. Até aqui tudo bem, parece-me razoável e até amável por parte da empresa de software do meu telemóvel querer poupar-me ao trabalho de escrever mensagens que só me fatigariam mental e fisicamente, acho que eles são mesmo o que o mundo designa, mui comummente, das pessoas das quais se diz "aquela pessoa é muito humana"; definição ou ideia que, se formos a esmiuçar, não faz qualquer tipo de sentido, a não ser que se assuma por oposto de humano o "cínico" que se refere a, como sabem, cão. Aquela pessoa ser muito humana é um facto que, parecendo que não, é bastante banal e se se assume por humanidade uma qualquer qualidade que faz das pessoas mais altruístas e caridosas, bem se pode dizer que isso não é a definição de humanidade, simplesmente porque a humanidade não é caridosa ou altruísta. É um paradoxo engraçado, na realidade todas as pessoas são extremamente "humanas" simplesmente porque somos, na generalidade, uns cabrões ímpares, cada um à sua maneira, daí o ímpares. Qualquer referência que nos equipare mais aos suínos ou aos cães me parece mais ajustada, enquanto animais que somos, e por nunca chegarmos a atingir o estado tão bonito e utópico de Humanidade. A humanidade é assim, há que engoli-lo.


Mas voltando à temática que aqui me trouxe e deixando o drama, 11 modelos de mensagem; Nada há como explorá-los! São eles:

"Estou atrasado. Chego às"
"Estou em reunião. Telefono às"
"Agora estou ocupado. Telefono mais tarde."
"Chegarei às"
"Reunião cancelada."
"Vejo-o às"
"Vejo-o dentro de"
"Telefonar"
"Parabéns."
"Obrigado."
"Também te amo."

Espero que já haja alguém tão chocado como eu, tão avassalado por uma destas mensagens como eu. Vamos analisar:

7 destas mensagens são claras referências à vida profissional da pessoa que possuí o telemóvel. Estar ou não estar, marcar ou desmarcar encontros, telefonemas e reuniões parece-me algo que um indivíduo faz durante bastante tempo enquanto funcionário de uma qualquer empresa com situação financeira que se adeqúe a possuir um telemóvel ou mesmo a ter reuniões. E mesmo não sendo esse o caso, poderá ser uma qualquer pessoa um membro de uma sociedade secreta e ter "reuniões" e "encontros" que poderá marcar e desmarcar a seu bel-prazer e com uma celeridade consideravelmente maior devido a estes modelos. E só deus sabe como isso é útil nas sociedades secretas.

A mensagem "Telefonar" faz-me um pouco de confusão. Penso que ninguém, no seu estado de sanidade mental perfeito, envia uma mensagem a uma outra pessoa que começa com um verbo no infinitivo. Simplesmente não faz sentido: "Telefonar ao José para saber se ele vai à caça hoje." Soa muito mais a Lembrete do telemóvel do que a mensagem que alguém envie a alguém, por mais humano que seja ou pareça ser.

Temos depois as mensagens "Obrigado" e "Parabéns" que sem dúvida só dão mostras da educação de uma pessoa e da sua organização para saber quando é que algum dos seus amigos celebra mais uma primavera ou teve algum acontecimento marcante na sua vida. São modelos um pouco inúteis na medida em que é simplesmente mais fácil e rápido escrever toda a mensagem que se segue ao "Obrigado" e ainda mais especificamente ao "Parabéns"; que ninguém me venha dizer que algum dia recebeu uma mensagem simplesmente a dizer "Parabéns" e, caso tenha acontecido, o mais que sinto é pena pelo pobre infeliz a quem tão sórdida sorte veio abençoar.

E somos chegados finalmente ao cerne da questão, ao âmago do horror, ao centro da comichão.
"Também te amo."
Ora bem, este modelo pressupõe muita coisa, e tudo o que ele pressupõe me ultraja. Suponhamos que uma pessoa recebe uma mensagem a dizer simplesmente "Amo-te." basta ir aos modelos de mensagem do seu telemóvel e, sem pensar muito no assunto, enviar uma bela mensagem predefinida a dizer que o amor é correspondido. Sendo assim, numa situação meramente hipotética, quando alguém recebesse uma mensagem do seu amado(a) a dizer "Precisamos de falar..." seria de esperar que houvesse uma mensagem predefinida onde se leria "O problema não és tu, sou eu." ou então "Foi bom enquanto durou." ou algo similar.
Além de tudo isto, a mensagem "Também de amo" pressupõe que a pessoa venha a receber a mensagem "Amo-te" o que nunca acontecerá caso ninguém ame essa pessoa, como a mais pura lógica indica. Isto só vem acentuar a gravidade da questão! Quer dizer que a Dona Lurdes, solteirona, que nunca viu, mas sempre pensou e ansiou ver um homem do qual gostasse a fazer coisas marotas com ela, se chegar a comprar, um dia, um telemóvel destes com o que foi "ajuntando" do pouco que o salário da fábrica de sardinhas enlatadas em molho de escabeche lhe permite, e se chegar a explorar esta pequena pasta de mensagens modelo, sentir-se-á imensamente frustrada por nunca ter tido ninguém que a amasse à conta daquele furúnculo estranho que ela tem na orelha direita! Está Dona Lurdes muito agastada psicologicamente e ainda lhe cai mais esta em cima, o não ser amada. Nunca ninguém lhe enviará uma mensagem a dizer "Amo-te" e aquela mensagem modelo ficará perdida dos anais da (sua) história. Prepara-se Dona Lurdes para por o baraço à volta do pescoço e pendurar-se por um ramo da macieira da sua humilde casa de modo a acabar com a sua triste existência, até que eu a paro e a mato instantaneamente com palavras que vos dirão "Lurdes jaz aqui, no pó vocabular". Deve-se esta paragem não à bondade da minha alma mas mais à agudeza da minha pena que vos quer livrar da imagem de Lurdes a tentar, infrutiferamente, pôr termo à sua imaginada existência acabando estatelada no chão, frustrada porque o galho não aguentou os seus meros 104 quilogramas e um furúnculo de brevíssima existência escrita.

Tal como Lurdes, muitas pessoas nunca poderão utilizar essa mensagem e, se se pôde , em tempos, processar o McDonalds por apenas oferecer comida de qualidade tal que fosse nefasta para todos os seus inocente e iludidos consumidores e ganhar o processo, também será possível processar esta companhia de software por danos psicológicos severos causados a todos os mal-amados descobridores dessa mensagem "Também te amo". Uma indemnização no valor de todas as vezes quantas essa mensagem modelo não será enviada, num tempo de paixão ardente e fogosa, é o mínimo que um indivíduo pode pedir. Sendo o Amor esse fenómeno tão de hormonas quanto pensamos que é de emoções, muitas seriam essas mensagens que, num tarifário barato, a 12 cêntimos por mensagem, e numa época de muita e tresloucada paixão (300 mensagens de amor/ dia) se enviariam. Daria uma fortuna de fazer inveja ao Patinhas, com todo o respeito que por ele mantenho.

E quem me diz a mim que não foi assim que metade do mundo que pensamos controlar o negócio do petróleo enriqueceu? Sim, isto porque por lá (refiro-me ao mundo islâmico) as paixões podem ser várias ao mesmo tempo, como é sabido, e enviar a mensagem "Também te amo" a apenas uma das 7 esposas seria mais um motivo para originar quezílias desnecessárias na família! Quantas vidas e lares o amor predefinido já não terá destruído, meus caros?

E é chegada finalmente a altura de relacionar isto com o início do post:

Jesus não ia querer isto...

Citação de Revolta:

"I too am not a bit tamed, I too am untranslatable
I sound my barbaric YAWP over the roofs of the world."
Walt Whitman, Song of Myself

"Também te amo."

domingo, 8 de novembro de 2009

Códice

Caros Leitores deste Blogue de Horrores,

é meu dever informAr-vos de que, apesar do título deste post ser "Códice" este pequeNo parágrafo introDutório nAda tem de mensagem codificada, Só para prevenir que alguém com um espírito mais aventureiro, À la indiana jones, ou com demasiado tempo livre nas suas mãos, como é o meu caso, quisesse Procurar uma mensagem que, desde o início deste post assumi seR inexistente. O que mais me impressiona é que, dito isto, eu tenho a mais profunda Certeza de que há, neste momento, um caro leitor que, mUnido da sua faca de mato de desbRavar imensAs florestas e cerrações vocabulares, se atirou com a sua camisa já esfiapada e ensanguentaDa amarrada Em volta da testa para o meio da dita amazónia das palavras desconhecidas. de Que servem os avisos, senhores? Se me ignoram até aqueles que, de livre e espontânea vontade, vêm até este lUgar... enfim, àquele leitor solitário que ainda me lÊ (?):

Segue-se mais um poema, que é o que me dá mais gozo fazer e como as mensagens secretas são sempre moda nada como misturar o que me é querido com algo profundamente comercial. Sou o Dan Brown da poesia! Assumindo, com o epíteto, a gritante vertente de fantasia e embuste que, a mim, assenta primorosamente. Porque é giro trapacear-vos; e acreditem que é a coisa mais rigorosa que posso dizer, é simplesmente giro.

Aqui vai disto:

Códice

Muitas letras, em formas discretas e soturnas, escorrendo,

Escorregando mesmo aba’xo da lama do mundo, escondendo,

Negando a sua significação; de costas na parede quando o facho

Sentinela passa uma, outra e outra vez… sem perceber a respiração

Arquejante dos vocábulos escondidos, atrás das esquinas mais perto...

Gemendo e suando aterrorizados, mordendo os lábios assustados

E só têm por certo aquela discrição que lhes dá sua forma esguia,

Mais gordos fossem e alguém os veria…


E na estreiteza sub-humana dos seus eixos, na sua fineza de lados,

Se dobram quando o índex meio curvado os sublinha sem pintar,

Com a força que fazem por não respirar quando o olho passa sem olhar

Outra vez e outra vez, como em uma anterior e fútil investida

Nada lhe grita a mensagem principal. Não lhe aponta, por leal, a escondida.

Dá o dedo voltas às páginas, gasta o papel e erode lentamente a tinta

Ignorante de que o quadro que a tela dá a ver esconde o que ela tem(!)

Do outro lado, do avesso, por dentro da fortaleza que o quadro pinta

(A mensagem já passou, olhaste-a bem?)

Rafael Cardoso Oliveira


Citação Encriptada:


"Talent hits a target no one else can hit; Genious hits a target no one else can see."

Arthur Schopenhauer


"There is only one diference between a madman and me. I am not mad."
Salvador Dali


Promise not to bleed on my suit and I'll kill you quickly...
The Spy

Frihet