De poemas em frente está toda a gente
Cansada.
Às três pancadas escritos constantemente;
Às três pancadas batendo em retirada;
Às três pancadas, na peça teatral da vida,
Dizendo lugubremente a sua linha ensaiada.
Às três pancadas: tudo.
Às três pancadas: nada,
Que nem tudo o que não nada,
Flutua para evitar morrer.
Às três pancadas abrimos a porta à morte
E com umas pancadas mais fechamos o caixão.
Nosso caixão e de todos os demais.
Puxando, se por dentro,
Ou de empurrão, se por fora vamos
Ou se por fora vão
As nossas mãos e as nossas intenções.
Às três pancadas declaramos amar,
E usamos de mais umas quantas para reforçar o amor.
Ignoramos as do peito, que o coração não bate nunca,
A não ser por três pancadas a mais de quando em vez.
Damos umas pancadas e umas bofetadas – também duas ou
três –
Quando os reveses da vida são melhores que nós
E quando a voz se cansa de bater nos três cantos
Que geralmente têm os nossos dias,
As nossas salas e as cidades que habituamos.
Habituamos as coisas que habitamos
Às três pancadas.
Cumprimos os cumprimentos e os comprimentos
De mãos dadas com a indiferença da repetição.
E, medíssemos menos ou cumpríssemos menos,
Todo mundo perderia esta aleatória relação
De ser vivo e velho só porque se deixou aqui chegar.
De três em três pancadas temos fome e morre uma criança.
De três em três pancadas temos fome e morre uma criança.
De três em três pancadas lembramos que temos um nariz que
sempre vemos.
De três em três pedradas sentimos o ar que nos infla e desinfla
todo o dia.
E de três em três pancadas nos lembramos porque odiamos
poesia.
Porque está em nós a regra de deixar o mundo ir
Abater-se sobre os seus joelhos e rezar a um deus
qualquer,
E a poesia não deixa isso. Não nos deixa a isso.
De três em três pancadas atraiçoamos a nossa dieta
E comemos broa abjecta com o pior chouriço
Enquanto, às três pancadas recordamos
Que a vida são três trancadas
No cu duro do mundo.
E cremos - porque precisamos - neste desfile de ignomínia
e idiotia,
Que são como o sal do pão e a verdura de cada dia,
Fazendo bem e mal às três pancadas que somos
Ratos feitores do mais adorado raticida.
E assim vamos decidida e indizivelmente em frente,
De três passos em três,
Vendo eu o que tu não vês e incapaz de te compreender.
Vendendo, eu, o que tu não sabes negar nem aceitar.
Poetizando umas ideias para perder tempo e dinheiro,
E repetindo prosa fraca que nos finja iluminar
Enquanto cai da mesma cinza no mesmíssimo cinzeiro.
Para chegarmos a ver que o teu novo é o meu velho
Na roda da fortuna, que só tem um algarismo.
E enquanto Atlas empina o mundo num joelho
Saltamos todos, voamos todos, do mesmo abismo.
(Valha-nos tal colossal malabarismo)
Rafael Cardoso
Oliveira