quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Ode das Sombras


Dobrada comendo a luz
De um prato negro na mesa escura,
Esquecida lembrando a cruz
Que ao peito lhe prende a loucura
De comer luz empacotada,
E de a ver empurrada pelos mesmo goles
Tomados todos de uma assentada
De vinho verde branco gaseificado
Comprado em promoção
Num supermercado.

Dobrado contando os nós
Que a vida dá num caixão alheio,
Esquecido lembrando a voz
Do homem que lhe deixou no correio
A carta de guerra ensopada em sal,
Que era mar e não água chorada,
Cansado de empacotar Portugal
Para a mesma jornada.

Dobrados contando as contas
Do terço que rezaram juntos,
Esquecidos olhando as montras
E o espectáculo dos outros defuntos,
Gemendo e chorando plangentes
Como facas arranhando lousa fria,
Rangem, em bruxismo, os dentes
Até lhos romper o dia.


Rafael Cardoso Oliveira

Sem comentários: