Sem tempo para revisões de forma (ou reformas).
Dia de Portugal - Tarde Modesta
Dia de Portugal - Tarde Modesta
Sentada à mesa farta de cor e farta de falar
Está Sofia, mulher de Baltazar e mulher só.
Farta de cantar ao pó e de contar migalhas,
Pensa da vida como de um conjunto de acendalhas
Demasiado frouxas para lhe dar um qualquer lume.
Sofia subiria até ao mais baixinho cume se as costas não
doessem,
Se a vida fosse difícil mas não verdadeiramente
insuportável,
Fosse o ar respirável e os seus pulmões inflassem de
alegria
E não de lágrimas ante cada tareia e cada dia
Em que sente que, em verdade, a vida é muita areia
Numa praia a que se não conhece o fim ou o fundo.
Sofia gosta do mundo mas gostava mais do mar.
Gosta de ver, de observar mas já não gosta de fazer.
Está gasta de fazer, e Baltazar a faz ver que ser mulher
É eternamente cair e eternamente estar doente.
Eternamente sentir-se de tarde na vida
E saber que se chega sempre tarde ante o telefone que
toca,
O arroz que queima, o filho que chora ou o pai que morre.
Sofia viveria numa toca se essa toca se chamasse “outra
vida”.
Assim, vive só em Portugal.
Perdida, modesta e desmilinguida.
De galochas fortes mas com a água até ao peito
No pantanal.
Rafael Cardoso Oliveira
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